Resumo de “As cidades e sua gente”
Há informações circulando na imprensa de que autoridades, preocupados com a desproteção de crianças e adolescentes nas ruas das cidades, têm adotado medidas que impedem a circulação destes jovens em horários propícios às ações de grupos, organizados ou não, que tentam envolvê-los em práticas ilegais, como a drogadição, a exploração sexual comercial ou, ainda, a atuação no trafico de drogas ilícitas. Se de um lado, segundo informações da imprensa, o denominado “toque de recolher” para crianças e adolescentes foi responsável por uma queda brusca no índice de ocorrências envolvendo este segmento etário, por outro lado, essa medida colide ao que tudo indica, com o preceituado na Constituição Federal. Ou seja, colide com o direito de ir e vir das crianças e dos adolescentes.
O decreto judicial – que estabelece um “toque de recolher” para sujeitos plenos de direito e que não manifestam qualquer conflito com a lei – concebido a partir de uma intenção reta, e, certamente, com apoio de parte significativa da população, caminha, mesmo involuntariamente, na direção contrária do direito ao acesso aos espaços públicos, da convivência e da sociabilidade. Ruas esvaziadas, para não falar no agravamento da segurança, são tristes. Sem as ruas e sua gente, não existem cidades.
Cabe a nós, a todos nós, sem a insensata companhia do medo e do ódio, reinventar, modestamente, nossas cidades. Não será mais possível desencadear em nossas cidades medidas e procedimentos inovadores para que a rua, em vez de perigosa, se torne educativa? Quem sabe se não estamos diante de uma oportunidade singular? Será que não é hora das cidades que aplaudiram o “toque de recolher” procurarem um outro caminho, coletiva e pacientemente, mais próprio seu, para a solução dos problemas que a atingiram? Quem sabe possa ser outro o exemplo que venha a partir de cidades como Taiobeiras, um efetivo exemplo de cidadania? É impossível que Taiobeiras possa ser um laboratório, um campo de teste de idéias para a solução deste problema, que não é só de Taiobeiras?
Destituída das ruas, nossa juventude estará ainda mais empobrecida. Será tão trágico o nosso tempo, que só somos capazes de conceber uma proteção que, simultaneamente, destrua? Ou podemos, com um impulso generoso, ressignificar nossos espaços públicos, reinventar programas de cultura e cidadania que envolvam nossas crianças e adolescentes com o cotidiano de suas cidades enfrentando o medo, o preconceito e criando alternativas que incluem e não segreguem? Não poderemos – poder público, sociedade civil organizada – encontrar saídas mais genuínas que restabeleçam a convivência da diversidade, do direito, da alegria de circular nas ruas e nas praças com segurança? Ou estamos fadados apenas a aumentar cada vez mais a segregação, esvaziar nossas praças e não cultivar a convivência? Seria bom que encontrássemos soluções para os problemas identificados nas nossas cidades que pudessem ser diferentes do “toque de recolher”. Vamos reinventar nossas cidades! Vamos transformá-las em espaços de inclusão e de cidadania! Vamos recuperá-las da solidão da ilegalidade e construir novas formas de sociabilidade urbana!